Condições de vida influenciam islamismo radical na África, analisa professora francesa

25/05/2012 08:09

Paris - Em artigo para o jornal francês Le Monde, a cientista política especializada em geopolítica dos conflitos e professora da Universidade de Versailles Saint-Quentin-en-Yveline, Julien Théron, afirma que o islamismo radical tornou-se um importante componente geopolítico em África. 

Na publicação, a professora destaca que a aparente unidade ideológica desses grupos, no entanto, mascara uma grande diversidade, mas que esses grupos radicais não são menos convergentes pelos seus objectivos.

Théron expressa que, apesar da ideia de um monopólio da facção terrorista Al-Qaeda sobre os grupos islâmicos africanos, na realidade é o Grupo Islâmico Armado argelino que serve de exemplo a muitos grupos armados. Segundo a especialista, eles adoptaram a estrutura em falanges e combatentes autônomos, mas sobretudo uma ideologia relativamente localizada e uma operacionalização fundada menos na acção local. 

Ela contextualiza que, na Somália, a União das Cortes Islâmicas emergiu como um movimento muçulmano composto, antes de se separar, tendo dois ramos radicais como produto, as famosas milícias Al-Chebaab e o Hizbul Islam antes de se fundir sob a bandeira dos chebaas negros. Embora em contacto com a Al Qaeda na Península Arábica, a guerra dos líderes e o colapso do regime no Iêmen provocaram certa pressa de distância em relação à Al-Qaeda. Contudo, a especialista afima que os chebaabs lutam antes de tudo pelo poder na Somália.

Da mesma forma, na Nigéria, o grupo Boko Haram, conquanto seja influenciado por movimentos salafistas e talibãs, pratica um islamismo heterodoxo que agrega práticas que têm mais da cultura africana do que do rigor islâmico. Théron opina que se a emergência sociológica de Boko Haram é comparável à do movimento talibã, ela se faz menos por uma adesão aos princípios do fundamentalismo do que sobre uma contestação política do poder na região. 

No Mali, atenta o artigo, é possível encontrar toda a diversidade dos grupos islâmicos do continente africano. Fora a Al-Qaeda do Maghreb islâmico (AQMI), que opera até fora do continente, muitos grupos têm surgido na metade norte do país após a conquista desta região pelos tuaregues secessionistas, grupos, que segundo Théron, se distinguem por diferentes objectivos. A especialista destaca que Ansar Dine é um movimento islâmico, mas dirigido por um tuaregue, Iyad Ag Ghali, que viveu na Arábia Saudita. Segundo ela, o grupo parece estar ligado tanto à AQIM como à independência Tuareg, mas não é separatista e prefere o estabelecimento de um regime islâmico em todo o país.

A autora ressalta outro grupo activo: o Movimento por Unificação da Jihad na África Ocidental (Mujao), que constitui uma força djhadista regional dirigida por um mauritano, Hamada OuldKhaïrou, que reivindica a incorporação, entre outros tuaregues, de nigerianos e chadianos. Ela diz aplicar-se dentro da lógica da AQMI e de Ansar Dine, mas também dos chebaas somalianos e dos islamistas do Médio Oriente ou da Ásia. “O seu objectivo é estender o jihadismo à África negra”, afima Théron. 

Para a autora, AQIM, Mujao, Ansar Dine constituem três facetas do islamismo radical na região do Sahel, cujas ideologias e objectivos são distribuídos de forma islâmico-nacionalista.

“Além disso, e trata-se de um desenvolvimento relevante, Boko Haram enviou ao norte do Mali combatentes nigerianos e do Níger”, escreve Théron.”Eles coordenariam as suas operações com a AQMI, que conseguiria finalmente supervisionar alguns destes grupos islâmigos emergidos em escala local, com inspiração religiosa sensivelmente distinta e atrelados à sua região de origem”.

Se estes diferentes movimentos se assemelham quanto à rejeição de um Ocidente libertário e de serem formados por regimes locais considerados corruptos, diferem-se nas suas origens geográficas, ideologias religiosas, demandas políticas e respectivos procedimentos. 

“O facto é que com a ausência crônica de melhores condições de vida locais, o radicalismo de oposição que partilham está a crescer. E é precisamente nesta oposição comum que eles extraem o seu principal factor de convergência estratégica. A luta contra esses grupos, portanto, deve reforçar os seus direitos locais, assim como a sua aliança de leste a oeste da África”, finaliza Thóren.

Fonte Africa21 Digital